terça-feira

Alinhavando memórias

A ilustração é algo que me fascina o que me fez procurar inspiração para "alinhavar" memórias nos livros que tenho em casa, como "A Chuva pasmada", de Mia Couto ilustrado pela Danuta.
Questionei-me: Seria a leitura deste género de livros o primeiro passo a dar?!
Com a cabeça atormentada por mil e uma ideias, deixando uma certa ansiedade vandalizar o meu sossego, fiz como sempre, parei e arrumei as ideias num cérebro que estava a ficar caótico roubando-me horas de um sono tranquilo!
A questão que se impunha era afinal "Por onde começar?".
Pesquisei, estudei, observei e decidi.
Vou precisar de uma boa dose de atrevimento (conquistada com estudo e prática) para me libertar das regras em que fui "formatada" nas oficinas que frequentei de bordado tradicional. Na minha idade é divertido "soltar-me" quebrando regras e ouvir-me a dizer que elas foram feitas para isso mesmo, para serem quebradas (não me entendam mal, refiro-me a bordados e trabalhos de mãos!).
imagem retirada daqui
Quanto a tecidos vou começar por estudar no blogue Shibori Girl e fico a ponderar a leitura do Wild Color e Memory on Cloth: Shibori Now, mas só caso ultrapasse a primeira etapa deste processo, em que vou utilizar tecidos que já tenho. Sinto a necessidade de algum estudo teórico e sei que a leitura ajuda-me a preencher algumas lacunas, mas tenho de limitar os meus investimentos!
Estou certa que o processo em si irá ensinar-me muito e indicar-me um caminho, que espero que seja o meu caminho, pois acredito que às vezes não há certo e errado, mas apenas aquilo que nos faz feliz e nos agrada ao tacto e à vista.
Já comecei a seleccionar e reunir tecidos (alguns são uma herança muito especial!) para uma primeira tentativa de reter em tecidos as histórias da infância dos meus filhos, recontando e tecendo ponto a ponto as nossas memórias.

 Após alguns exercícios práticos, começarei pelas histórias que sonolentos inventávamos. Na hora de os deitar, enquanto a Inês preferia ler e o António ver e escutar, a Madalena recusava veemente a leitura, preferindo imaginar e inventar histórias. Então eu começava:
- "Certo dia, uma menina no seu cavalo branco..." 
- "Mãe o cavalo era mágico e voava"
- "No seu cavalo branco, com majestosas asas sobrevoava o Reino encantado..."
e continuávamos, com os irmãos, uma história a 4. Ora ela, ora eu, menos vezes eles, íamos acrescentando aventuras, cenários e personagens. A minha avó dizia que a Madalena, pela sua fértil imaginação, tinha tudo para ser uma grande contadora de histórias ou uma grandíssima mentirosa, mas enganou-se redondamente! Os números, contra tudo o que fazia prever, conquistaram-na, tal como ao irmão, e encontra neles o seu equilíbrio.
Como nunca tive queda para o desenho, o António irá traçar a lápis as personagens a que darei vida com linhas e tecidos. Junto com a Madalena serão os criativos no que conta a ilustração e a Inês a criativa na redacção da personalidade das personagens. A mim vai-me caber conjugar fábulas e histórias com ilustrações em tecido, auxiliando-me dos conhecimentos matemáticos dos apaixonados por números, tentando assim seguir algumas proporções e formas.
Penso que aqui vou encontrar muito com que me entreter e aprender. Será um reflexo das minhas memórias, uma tentativa de registar as nossas vivências familiares!
A vontade de tentar algo diferente é da responsabilidade da Jude Hill, a quem muito agradeço a possibilidade de tentar algo novo, reconhecendo que o valor das suas aulas está muito além da minha contribuição, para que esta sua iniciativa possa continuar.
Comecei a acompanhar o movimento Slow Stitching e aguardo a chegada do livro da Claire Wellesley-Smith. Enquanto isso vou preparando os materiais para devagar e com todo o tempo do mundo recontar as nossas memórias, alinhavando-as.
Vamos ver se conseguirei libertar-me, perder-me no passado e reencontrar-me no presente "alinhavando" as nossas fantasias do tempo em que os deitava e, aconchegando-os, rezava para que adormecessem rapidamente. Cada vez penso mais que devemos de ter cuidado com aquilo que desejamos. Quem me dera que esses momentos tivessem sido mais demorados e que as minhas preces não tivessem sido ouvidas! Mas o tempo também era outro e a exaustão ao final do dia, a vontade egoística de ter um momento meu, outras vezes nosso para namorarmos, fez com que deixasse escapar esses pequenos momentos, que eram em si tão grandes!

7 comentários:

méri disse...

Nem calcula, Sofia, como este seu projeto está a ser inspirador para mim. Não para avivar memórias (mas também) mas para dar uso a tanta tralha que me está a aparecer. Vou seguir de muito perto

méri disse...

Voltei aqui para lhe deixar este endereço de blogue, que sigo há já algum tempo:
http://www.bluepeninsulaknits.com/

Penso que vai gostar

Sofia Amaral M. disse...

Obrigada Méri, já coloquei o blog na minha barra lateral para seguir atentamente. Hoje em dia acabo por me perder na net!!

Paula disse...

Sofia, não estava à espera de me emocionar a esta hora da manhã (são 9h). A minha memória volta tantas vezes a esses tempos de histórias inventadas na hora de dormir. Também eu desejava que adormecessem rapidamente para poder voltar aos afazeres que me faltavam e a ter tempo para um bocadinho de conversa antes de dormir, nem que fosse 10min. E agora tenho uma saudade enorme de os ter de novo. Mas não posso porque esse tempo não volta. Não me arrependo do tempo que entretanto passou que tem outras coisas boas (e que daqui a uns anos tb hei-de recordar) mas sinto a falta desses tempos. Às vezes dou por mim na rua a observar os bebês e as crianças pequenas de outras mães e a pensar nos meus. Ainda há pouco quando voltava a casa para vir buscar uma coisa que me esqueci veio-me à memória pedaços de tempo em que os levava no carro bem pequeninos para as actividades de Verão e a risota era mais que muita pela liberdade que experimentava em ir para a praia em vez de os deixar na escola. Tontos que éramos riamos sem razão só pelo prazer de gargalhar e de antecipar liberdade das férias que estavam à porta :)
Bom, passando à frente ... Acho este projecto fantástico e maravilhoso :) E não estou a exagerar! Eu sou completamente fan desta liberdade de criação. Do fazer pelo prazer puro e se quebrar regras então fica completamente no top. Há uma artista têxtil que acompanho http://threadandthrift.blogspot.pt que faz obras semelhantes. Se calhar não tão completas como a que pretende fazer mas de qualquer modo julgo que pode ser um exemplo. Sofia, devo dizer-lhe que é uma Artista e que tenho uma grande admiração pelas sua criatividade e pelo que faz.

Inês Sousa de Menezes disse...

Não me lembro nada disso hehe
Mas terei todo gosto em ajudá-las, com as palavras, nesse seu novo projecto ;)

Sofia Amaral M. disse...

Inês não te lembras porque raramente alinhavas nas fantasias dos teus irmãos, gostavas mesmo era de te isolares e leres sem ruídos de fundo!


Sofia Amaral M. disse...

Obrigada Paula por tudo!
Pelo tempo para ler os meus textos enormes, por me dar um pouco de si e do seu tempo aqui e no seu blogue, pela partilha de mais um blogue extremamente interessante e pelo elogio carinhoso que me fez, para mim uma grande motivação mas, sinceramente, não me considero de todo uma artista, só se for "caseira"!